Minha trajetória de vida e profissão
Nasci em 11/11/1952, num rancho de taipa, numa cidadezinha chamada Cássia, em Minas Gerais. Dai a origem do meu nome, Cássio. Sou o sexto filho de uma família de treze irmãos. Família muito humilde, com pouquíssimos recursos.
As dificuldades me fizeram um menino rebelde, a ponto de brigar na escola e desistir das aulas. E quando fugia da escola corria para o meio do mato para observar a natureza, os insetos, a formação das plantas e seus brotos... Por várias vezes tentei fugir de Cássia, escondido nos caminhões de transporte de mercadorias que por lá passavam.
Aos nove anos fui trabalhar num olaria, levantando e empilhando tijolos. Nos intervalos eu modelava bonequinhos de barro. Intuitivamente já começava nascer a vontade de esculpir, mas eu ainda era muito pequeno para entender o que estava acontecendo. Nesta mesma época comecei a desenhar rostos a partir do contato que tive com um mascate. Ele pintava sobre fotografias. Eu achava que se ele podia pintar eu também o faria, e melhor, pois a pintura do mascate era visivelmente tosca. Desenhei todos os membros da minha família e os elogios eram crescentes. As pessoas olhavam meus desenhos e diziam: - Esse menino vai longe!
Estimulado pelos amigos e impulsionado pelo desejo de buscar minha independência, aos 14 anos, vim para São Paulo. Aqui consegui um emprego no Banco Itaú e fui morar numa pensão. Quando almoçava não podia jantar, pois investia um pouco do que ganhava na compra de materiais e ainda precisava mandar dinheiro para minha família.
No Banco continuava desenhando, agora já recebia encomendas. Cheguei a receber proposta para trabalhar no Marketing do Banco, eles reconheciam meu talento e pretendiam investir nisso. Ganhei uma bolsa de estudos e fui estudar publicidade na Escola Panamericana. Não cheguei a concluir o curso porque o gosto pelas Artes Plásticas falava mais alto.
Incentivado pelos colegas do Banco separei meus desenhos e fui apresentá-los numa galeria, onde pela primeira vez vi uma escultura do Pichere. Toquei na escultura e um som ecoou por todo espaço. Senti uma emoção tão forte e conclui naquele momento que queria ser escultor. A escultura do Pichere me chamou a atenção de tal forma que logo que pude, e com o escasso dinheiro que possuía, fui atrás de algum material que eu pudesse modelar. Comprei arame e comecei a dar formas usando as mãos como ferramenta, não dava para comprar as ferramentas necessárias.
Usei meu irmão como modelo e fiz minha primeira escultura de arame. Mas ainda não estava satisfeito e continuava pesquisando outros materiais como calotas de carro, conchas de pegar feijão, ferro de construção, etc. Buscava também formas abauladas.
Dessas pesquisas construí figuras onde o rosto era a calota de carro, completados com pintura, os cabelos eram feitos de arame e enfeitados com folhas recortadas de chapa.
Apesar de reconhecer certa criatividade nas minhas obras, eu continuava insatisfeito.
Eu buscava uma maneira de chamar a atenção sobre meus trabalhos, mas ainda não tinha convicção do que era arte, onde esta a arte?
Percebia que o ser humano era dotado de muita inteligência e capacidade inventiva, pois construía coisas gigantescas, máquinas fenomenais, mas eu ainda não sabia onde estava minha força, ou melhor, dizendo minha arte. Estudava uma maneira de mostrar força e técnica dentro do meu trabalho. Passei a dar nó em barras de aço, construía formas sinuosas. A cada nova etapa, surgiam problemas e eu criava soluções pertinentes para cada uma delas. Meu objetivo era fazer com que o expectador tivesse a ilusão de que as barras de aço eram maciças.
Em 1972, fiz minhas primeiras obras abstratas em aço inox com solda dourada, trabalhos que me permitiram realizar minha primeira exposição individual no Banco Itaú.
Em 1975 participei da Bienal com trabalhos que apresentavam formas sinuosas e com um nó de 2,20m de altura feito em aço inox. Com a repercussão da Bienal, através da mídia, eu achava que meu trabalho era importante, mas ainda não tinha desenvolvido a percepção suficiente para compreender o que era arte e onde estava a arte. Passado a Bienal, trabalhei por uns três anos fazendo base de mesa, abjure e mesa de centro utilizando a técnica apresentada nos trabalhos mostrados na Bienal. Era um meio de sobrevivência, pois eu tinha consciência de que esses utensílios não podiam ser considerados trabalhos de arte, mas eu precisava sobreviver.
Nesta época achava que devia voltar para o figurativo, pelo fato de ter maior domínio, achava que isso iria me dar segurança. Passei a modelar com argila e fiz um torso de mulher. Novamente veio a inquietação e de novo senti que não estava sendo criativo. Eu queria algo novo. Algo que me surpreendesse.
Num ato de rebeldia joguei o torso no chão e vi que ele se fragmentou. Gostei do que vi. Tornei a juntar as partes e foi ai que encontrei uma saída. Passei a fazer as mulheres em fragmentos e assim foram nascendo uma série de outros trabalhos: cavalos, ovos, esferas, tudo em bronze.
Passei doze anos trabalhando nesta linha de fragmentos em bronze, criando troféus prêmios importantes como: marketing best, professor emérito, prêmio do jornalismo (liberalismo), prêmio veículo de comunicação, prêmio colunista e outros.
Com o passar do tempo fui aprimorando meu entendimento sobre arte. Passei a compreender o que é arte, fui abandonando as formas figurativas convencionais e fui buscando novas formas para me expressar, agregando movimento em alguns trabalhos.
Quando me senti maduro, iniciei um desenfreado processo de criatividade. Comecei a produzir trabalhos abstratos em chapa de aço, que lembravam os fragmentos dos trabalhos em bronze. A cada trabalho realizado, minha cabeça ia se abrindo para novas possibilidades. Comecei a lembrar de detalhes da época em que eu era office-boy no banco. Os papeis amassados, jogados no lixo, servia como referência. A partir dai nasceu a Série dos Amassados em chapa de aço.
Desta vez eu não tinha nenhuma preocupação em representar figuras, já sentia e reconhecia a força da arte. Percebi que o exercício de observação da natureza e de tudo que está ao nosso redor nos fornecem todas as formas, basta saber representá-las plasticamente. Passei a olhar com mais cuidado para as erosões do solo, os estufa mentos das pinturas se rompendo pela umidade, as sombras se projetando, etc. Assim foram nascendo as Rupturas, as Rasgaduras, as Explosões, as Rendas... Eu estava livre para criar e tinha confiança e compreensão do que estava fazendo. A criatividade tornou-se infinita.
Hoje tenho consciência de que aprendi a fazer Arte na prática, não tive acesso a informações teóricas, como a maioria dos artistas. Meu caminho foi longo e minhas experiências foram consistentes e intensas, por isso posso afirmar sobre a importância do escultor executar a sua própria obra, sempre que ele tiver condições para isso.
O fazer nos conduz a inúmeras possibilidades de criação, pois até quando erramos aprendemos com o erro. Ao acompanhar todo o processo do meu trabalho vou transformando as sobras, as rebarbas, os respingos e vejo nascer novas composições, tornando infinitas as criações...
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